Há algumas doenças que geram aposentadoria por aposentadoria por invalidez, atualmente denominada como aposentadoria por incapacidade permanente.
As doenças, por si só, não incapacitam o ser humano, por mais que abstratamente consideradas sejam avaliadas como graves pelo senso comum. É necessário investigar se em decorrência da patogenia o segurado sofre limitações reais para o trabalho que ele desempenhe.
Essa diferença de abordagem é muito importante, pois o trabalho é um dos aspectos dignificantes do segurado acometido por doença, a quem deve existir igualdade de oportunidades para exercer a atividade profissional como um direito e não como mais uma barreira social que o limite ou exclua.
Obviamente isso não se aplica se o trabalho for um obstáculo efetivo ao segurado, que sem meios de desempenhar suas funções pode se ver prejudicado financeiramente. Neste caso, a aposentadoria por incapacidade tem por finalidade substituir a renda regular e promover proteção securitária (artigo 34 e seguintes da lei 13.146/15).
Todavia, se faz essencial distinguir incapacidade laboral e pessoa com deficiência para fins previdenciários. Enquanto a incapacidade laboral é situacional, ela deve ser demonstrada ativa e particularmente afastando por completo qualquer desempenho de função, a pessoa com deficiência possui barreiras infligidas por impedimentos de longo prazo, que não necessariamente inabilita ao trabalho, mas lhe concede direito à aposentadoria em regime especial, diversa da aposentadoria por incapacidade.
Veja abaixo uma lista com 7 doenças possíveis para deflagrar a aposentadoria por incapacidade.
Quem tem direito à aposentadoria por invalidez?
O artigo 151 da lei 8.213/91 traz uma lista de doenças que geram aposentadoria por invalidez, desde que elas sejam causa suficiente para o afastamento do trabalho.
A jurisprudência nacional, vez ou outra, amplia o rol de doenças previstas pelo órgão previdenciário sempre que no caso em particular o segurado esteja com moléstia grave, além de serem aferidas as circunstâncias pessoais, como idade e recolocação no mercado de trabalho; a concessão da aposentadoria por incapacidade foi obtida, por exemplo, pelo agricultor de 53 anos atingido por problemas ortopédicos (vide AC 5020335-49.2018.4.04.9999, TRF4).
No caso de aposentadoria por acidente de qualquer natureza, doença do trabalho, ou as doenças graves em lista elaborada pelo Ministério da Saúde e Previdência (atualmente a lista é suprida pelo artigo 151 da lei 8.213/91 e artigo 30, § 2º, decreto 3.048/99) não se exige prazo de carência do segurado, pois o benefício está disponível para o empregado desde o início da atividade remunerada.
São requisitos para a aposentadoria por incapacidade:
- Não ter perdido a qualidade de segurado (estar contribuindo mensalmente ao INSS ou no período de graça – prazo que a lei mantém o trabalhador como segurado independente de contribuições ao INSS);
- A carência de 12 meses geralmente é exigida para a aposentadoria por incapacidade em razão de doenças não reconhecidas pelo INSS, que impeçam o trabalho e não tenham vínculo com seu exercício (artigo 25, I, lei 8.213/91);
- Incapacidade total e permanente para o trabalho (necessita exame médico-pericial no INSS ou perícia judicial se o benefício é discutido no Poder Judiciário).
A decisão judicial colacionada abaixo explica integralmente o benefício da aposentadoria por incapacidade, inclusive pontuando a possibilidade de o aposentado receber adicional de 25% sobre a aposentadoria se ele depende de cuidadores ou do auxílio de terceiros. Veja:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE LABORAL. CARÊNCIA. INEXIGIBILIDADE – ARTIGO 151 DA LEI Nº 8.213/91. INCAPACIDADE LABORAL. TOTAL E DEFINITIVA. INGRESSO NO RGPS. AGRAVAMENTO POSTERIOR. ACRÉSCIMO DE 25%. AUXÍLIO DE TERCEIROS. NECESSIDADE. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO.
[…]
2. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de 12 (doze) contribuições mensais; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).
3. O segurado portador de enfermidade que o incapacita total e definitivamente para a sua atividade habitual, sem chance de reabilitação, tem direito à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.
4. Caso o segurado seja portador de doença elencada no artigo 151 da Lei nº 8.213/91, afasta-se a exigência de carência de contribuições para o requerimento/recebimento de benefício previdenciário.
5. Prevê o art. 42, §2º, da Lei nº 8.213/91, a concessão da aposentadoria por invalidez ao portador de moléstia existente antes da filiação ao regime, quando a incapacidade sobrevier em função da progressão ou agravamento da doença.
6. Não há falar em incapacidade preexistente ao ingresso no RGPS, pois comprovado que a incapacidade laborativa decorreu do agravamento da enfermidade.
7. O segurado que necessitar de assistência permanente de terceiros para a realização de suas atividades habituais faz jus ao acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o valor do benefício.
(TRF4 5062541-15.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 22/11/2018)
Outro detalhe muito importante que não pode ser esquecido é a doença preexistente. Quando o trabalhador já possuía a doença antes de iniciar seu tempo contributivo, a aposentadoria por incapacidade poderá ser admitida se a enfermidade foi desenvolvida ou piorou no decorrer do exercício profissional (artigo 42, § 2º, lei 8.213/91).
Doenças que geram aposentadoria: AIDS/ HIV
A AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) teve repercussões mortíferas nas décadas de 80 e 90, quando ainda pouco se sabia sobre ela. Atualmente, o soropositivo possui relativa qualidade de vida e o tratamento é em geral, eficaz.
Como já foi mencionado, a doença abstratamente considerada não é suficiente para gerar aposentadoria por incapacidade, pois é indispensável que o caso particular demonstre a integral e definitiva inabilitação ao trabalho.
Por vezes, algumas decisões judiciais concedem esta aposentadoria por razões socioambientais, como o preconceito em relação à doença ou a dificuldade de acesso ao mercado de trabalho imposta pela enfermidade.
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AIDS. INCAPACIDADE. CARACTERIZAÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA.
I. Submeter segurado portador do vírus do HIV à permanência na atividade laboral seria cometer, com ele, violência injustificável, ante a extrema dificuldade em virtude do preconceito sofrido. Precedentes desta Corte.
II. Demonstrado que o autor está total e permanentemente incapacitado para o exercício de atividades laborativas, deve ser concedido auxílio-doença desde o cancelamento administrativo, com a posterior conversão em aposentadoria por invalidez a partir do laudo pericial.
(TRF4, AC 5042366-69.2014.404.7100, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, juntado aos autos em 02/03/2016)Embora o artigo 43, § 4o da lei 8.213/91 determine que o aposentado por incapacidade poderá ser convocado a qualquer momento para avaliar a manutenção da aposentadoria ou a viabilidade de eventual reabilitação e retorno ao trabalho, o § 5º do mesmo artigo, expressamente liberou o indivíduo com AIDS desta obrigação.
Dessa maneira, uma vez concedida a aposentadoria por incapacidade em razão do vírus HIV, ela será vitalícia.
Parkinson
O mal de Parkinson é um distúrbio do sistema nervoso central que afeta a capacidade motora do indivíduo, que passa a apresentar tremores incontroláveis.
A doença está efetivamente elencada no rol das enfermidades do artigo 151 da lei 8.213/91, portanto, o laudo médico circunstanciado (diagnóstico, por exemplo), além da perícia do INSS, geralmente é suficiente para a concessão administrativa do benefício.
Apesar da doença de Parkinson estar popularmente associada à velhice, ela pode vigorar a vida toda, desde idade tenra. No caso do idoso que inicia os sintomas da doença é recomendável que ele ou a família procurem um advogado previdenciarista para avaliar quais aposentadorias são cabíveis para o seu caso e qual delas traria maior vantagem financeira para ele.
Após a última reforma previdenciária, por exemplo, o cálculo da aposentadoria comum piorou bastante, mas a aposentadoria em razão de doença grave elencada, como o mal de Parkinson, consistirá numa renda mensal correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, o que pode ser financeiramente muito mais interessante (artigo 44, lei 8.213/91).
Alienação mental
A alienação mental é terminologia ampla que alberga quaisquer distúrbios da qualidade mental do segurado, podendo se manifestar de diversas maneiras, a exemplo da esquizofrenia, do distúrbio borderline, transtorno obssessivo-compulsivo, depressão crônica, entre outros.
Devemos sempre nos atentar para a realidade do segurado, que pode ser atingido em graus diversos de afetação, às vezes de tal modo que não impeça uma qualidade de vida satisfatória. Além disso, pode ser constatado que não é a doença o que inabilita o segurado, mas a sobremedicamentação do paciente para contê-la, neste caso a impossibilidade de trabalhar é um efeito direto de seu tratamento, o que também ensejaria o benefício.
As síndromes de sofrimento mental podem, inclusive, sobrevir do ambiente de trabalho caótico, hostil ou desproporcionalmente exigente. Vale a pena buscar auxílio em qualidade mental e se submeter a avaliações diante de médicos do trabalho, psicólogos vinculados ao CRAS e CAPS, entidades beneméritas ou mesmo clínicos privados, para que o bem-estar do trabalhador esteja sempre em dia e ele possa colher eventuais diagnósticos com segurança.
Esclerose múltipla
A esclerose múltipla é doença autoimune, crônica e incurável, que tende a se agravar com o tempo. A lesão nos nervos pode evoluir de modo a comprometer a fala, a coordenação motora e a mobilidade.
No entanto, algumas pessoas são assintomáticas e podem permanecer por muito tempo nesse estado de remissão (ausência de atividade ou avanço da doença).
Na decisão abaixo, o INSS negou o benefício alegando capacidade para o trabalho, decisão que foi reformada judicialmente no sentido de viabilizar a concessão e reconhecer a incapacidade:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL. DOENÇA DEGENERATIVA. CONDIÇÕES PESSOAIS. IMPEDIMENTO DEFINITIVO.
[…]
2. O julgador, via de regra, firma sua convicção com base no laudo do expert, embora não esteja jungido à sua literalidade, sendo-lhe facultada ampla e livre avaliação da prova.
3. No caso dos autos, ainda que o laudo pericial tenha concluído pela capacidade laboral, considerando que a autora é portadora de doença degenerativa, incurável, imprevisível e que lhe impõe tratamento contínuo, bem como que suas condições pessoais são desfavoráveis, resta comprovado seu impedimento total e definitivo para os trabalhos pesados, razão pela qual tem lugar a concessão de aposentadoria por invalidez.
(TRF4, AC 0021381-03.2014.404.9999, Quinta Turma, Relator Luiz Antonio Bonat, D.E. 25/04/2016)
Nunca é demais repetir que as circunstâncias pessoais do segurado, suas lutas terapêuticas e seu histórico médico são elementos de verificação importantes para assentar a espécie de impedimento gerado pela enfermidade. Além disso, o tipo de trabalho executado também deve ser ponderado, de modo a conferir a influência da doença sobre a qualidade do desempenho exigido.
Hanseníase
A hanseníase, ou lepra, é uma doença infecciosa bacteriana que danifica os nervos, embora comporte tratamento por meio de terapia e medicamentos.
Historicamente, a doença foi alvo de diversos preconceitos, por meio do isolamento social das pessoas doentes, que eram afastadas do convívio comum.
Em razão da doença tolerar o tratamento e controle, geralmente o benefício da aposentadoria por incapacidade é afastado nos casos remissivos, em que o doente não apresenta sintomas, como podemos identificar na seguinte decisão judicial:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. NÃO COMPROVAÇÃO DA INCAPACIDADE.
1.. Dentre os elementos necessários à comprovação da incapacidade, com vistas à concessão de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, a prova pericial, embora não tenha valor absoluto, exerce importante influência na formação do convencimento do julgador. Afastá-la, fundamentadamente, seja para deferir, seja para indeferir o benefício previdenciário, exige que as partes tenham produzido provas consistentes que apontem, de forma precisa, para convicção diversa da alcançada pelo expert. Hipótese não configurada.
2. Tendo o laudo pericial judicial concluído que inexiste doença incapacitante para o trabalho, e comprovado que as patologias que já acometeram a parte autora não mais se encontram ativas, não há direito a auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
(TRF4, AC 5016937-42.2010.404.7100, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio Favreto) Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 27/01/2015)Disso se extrai que fora dos períodos de recidiva (reaparecimento recorrente dos sintomas), provavelmente o benefício será negado sob a justificativa de permanência da capacidade ao trabalho.
É preciso ter cuidado, pois se a recidiva é instável e frequente, a situação de abalo sobre as relações de trabalho é inevitável, e deve com toda a certeza, ser considerada.
Epilepsia
A epilepsia é um estado cerebral de perturbação de células que provoca convulsões, inclusive com perda da consciência.
A doença, contudo, tem controle por via medicamentosa oral, que pode ser suficiente para promover qualidade de vida e normalidade na rotina.
Alguns casos, porém, são resistentes ao tratamento medicamentoso, com baixa resposta e repercussão negativa na vida do indivíduo. Somente nesse caso, geralmente se reconhece a hipótese de incapacidade laborativa permanente e total para a aposentadoria do epiléptico. Observe a seguinte decisão judicial:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. EPILEPSIA. INCAPACIDADE NÃO COMPROVADA.
[…]
2. O segurado que não comprova estar incapacitado para o exercício de atividade laboral não faz jus ao recebimento de benefício previdenciário por incapacidade.
3. A epilepsia é considerada moléstia incapacitante quando demonstrado que é refratária ao controle medicamentoso, enquanto perdurar essa condição, o que não restou comprovado nestes autos.
(TRF4, AC 5041871-53.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 11/04/2019)
Mais uma vez, por mais grave que a doença seja, ela deve, de fato, interromper a normalidade da vida diária e laboral do segurado, de modo que manter uma relação de trabalho não seja somente difícil, como praticamente impossível.
COVID-19 e sequelas
A COVID-19, infecto contagiosa de espectro viral, tem surpreendido profissionais da saúde no mundo todo, uma vez que ela não respeita padrões ou critérios de atuação no organismo dos indivíduos contaminados.
Algumas pessoas são assintomáticas, enquanto as sintomáticas além de grave comprometimento pulmonar podem se sujeitar a sequelas que não desaparecem pelo transcorrer do tempo.
O cenário pós-covid pode trazer circunstâncias graves à pessoa, como fadiga extrema, alterações respiratórias e doenças cardíacas.
A gravidade da doença provavelmente irá desencadear a judicialização do tema com prováveis reconhecimentos de aposentadoria por incapacidade ou auxílio-doença a depender da temporalidade dessas sequelas.
Mas atenção! É necessário verificar se a COVID-19 foi adquirida como doença do trabalho (no exercício da atividade profissional ou em razão dela) ou não, para fins de carência (número mínimo de contribuições). Além disso, as sequelas proporcionadas devem ser efetivamente incapacitantes, com comprovação. A COVID-19, em si, não poderia gerar aposentadoria por incapacidade (definitiva e total) se não por meio das sequelas que está apta a produzir.
Se a COVID-19 for considerada doença do trabalho (o trabalhador se expôs em contexto de atividade profissional), o reconhecimento da aposentadoria ou do auxílio-doença pode ser encurtado pela via administrativa, porque a formação de provas, nesse caso, é mais fácil do que quando a doença é trazida por outros meios (bastaria prova da conexão entre exposição da saúde e trabalho).
Em razão da novidade da doença, que determina a impossibilidade técnica de avaliar a condição permanente das sequelas, bem como a inexistência, até esse momento, da inclusão da doença em instrumentos normativos do INSS, é possível que o caso deságue em várias discussões judiciais do benefício.
Breves conclusões
Conforme demonstrado, a aposentadoria por incapacidade possui uma série de requisitos de admissão, como a prova da qualidade de segurado e a comprovação do impacto negativo da doença grave sobre a relação de trabalho.
Segundo o entendimento tradicional do Supremo Tribunal Federal (STF), a lista de doenças graves do INSS é taxativa (inflexível) para ensejar proventos integrais (valor financeiro aumentado – RE 656.860), mas é muito possível que os tribunais brasileiros comecem a mitigar essa tese conforme o surgimento de novas patologias, algo muito plausível diante das sequelas da Covid-19, por exemplo.
Dessa maneira, procure sempre um profissional habilitado e especializado para uma consultoria ou planejamento de sua aposentadoria.
Fonte: saberalei.com.br