No Dia Internacional da Mulher, 8 de março, o Sindicato dos Metalúrgicos de Carlos Barbosa entrevistou a desembargadora aposentada Maria Berenice Dias, que foi a primeira mulher a atuar como juíza no Rio Grande
do Sul. Por ter enfrentado muita resistência e preconceito dos colegas magistrados homens, Maria se tornou uma incansável defensora das
minorias, estando sempre à frente de causas como o Direito da Mulher, da Família e dos LGBTI+. Confira a entrevista completa, por vídeo em nossa fanpage: Facebook.com/metalurgicosdecarlosbarbosa


Sindicato: como foi o início da sua carreira em um universo tão masculino?


Maria Berenice Dias: a atuação no Poder Judiciário foi exclusivamente masculina por mais de 100 anos no Rio Grande do Sul, sem nenhuma
mulher, sem sequer conseguir obter autorização para fazer a inscrição para o concurso, que dirá fazer o concurso e ser aprovada. E esse foi um
desafio que eu acabei aceitando. Eu pensei “vou fazer e se me deixarem eu assumo”, sempre procurando mostrar que eu teria condições e capacidade para me tornar uma magistrada e, mesmo assim, foi uma luta difícil.

Tentaram de todas as maneiras reprovar e boicotar todas as mulheres. Aceitaram por um voto, o de desempate do presidente do conselho, que as mulheres participassem do concurso. No final foram aprovadas duas mulheres e eu era uma delas. Em toda minha carreira nunca fui promovida. Quando chegou a minha vez de ser promovida por tempo de serviço (promoção compulsória por antiguidade) eu tive sete votos de rejeição. E essa dor de sempre ser discriminada me fez sensível as causas das minorias; me fez mais sensível a todo tipo de discriminação.

Eu não suporto discriminação. E eu tento levar isso para minha profissão. As mulheres sempre foram punidas pela lei pelo simples fato de serem mulheres. Fui a primeira magistrada a ter um site onde eu publicava essas decisões de vanguarda, que rompiam esses padrões vigentes. Escrevi livros para promover essas ideias.


Sindicato: ao longo da sua trajetória as mulheres alcançaram muitos direitos, mas a passagem dos anos nem sempre significa evolução, como estamos percebendo. Segue acontecendo ainda muitos casos de violência. Há uma onda de conservadorismo que prega a volta de um modelo mais convencional da família. Bate uma revolta?

Maria Berenice Dias: não chega a ser uma revolta, mas dá mais gana e mais garra para continuar. A trajetória da mulher sempre foi marcada por isso. Nada se conseguiu de graça em um mundo absolutamente conservador, absolutamente machista e totalmente homofóbico, onde está em vigor um modelo masculino que sempre teve valor. Que mulheres mudaram a história? As raras, que eram esposas de um político ou, então, tinham algum tipo de visibilidade.

A realidade da vida não é essa. Sem muita movimentação não se consegue alguns avanços. O conservadorismo custa um preço muito caro que é o de voltar ao passado, em que que as mulheres precisavam ficar dentro do casamento, por que do lado de fora elas eram absolutamente desqualificadas. Este modelo que querem voltar, ao meu ver, não é bom.

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