Em um primeiro momento, a pandemia trouxe uma espécie de “estado de angústia coletivo”, um pânico generalizado que se manifesta não só em pessoas que já faziam algum tipo de acompanhamento psicológico, mas até mesmo em pessoas definidas por eles como funcionais. Apatia, irritabilidade, distúrbios de apetite, insônia e até déficit de atenção são sintomas cada vez mais corriqueiros, efeitos decorrentes do desespero e da impotência perante um inimigo invisível chamado Coronavírus.

Um estudo conduzido pela Fiocruz Brasília destaca que 65% dos participantes apresentam algum nível de estresse, 61,6% de ansiedade e 61,5% de depressão. Sintomas de ansiedade classificados como extremamente severos foram relatados por 33,8% dos participantes. Esse percentual foi de 21,4% e 19,5%, respectivamente, para sintomas extremamente severos de depressão e estresse.

Um erro comum é pensar que a pandemia causou esses indicadores preocupantes. Na realidade as pessoas já apresentavam diversas questões com a saúde mental e a pandemia piorou. Como um vulcão, colocou tudo o que estava embaixo do tapete na nossa cara!

Existe sim, uma elevada prevalência de sintomas depressivos e ansiosos na pandemia: pode ser explicado por diversos fatores: ação direta do vírus da Covid-19 no sistema nervoso central, as experiências traumáticas associadas à infeção ou à morte de pessoas próximas, o estresse induzido pela mudança na rotina devido às medidas de distanciamento social ou pelas consequências econômicas, na rotina de trabalho ou nas relações afetivas e, por fim, a interrupção de tratamento por dificuldades de acesso.

A pandemia deixou claro que quando nos isolamos, ficamos sozinhos, com o sentimento iminente de morte por nossos familiares, preocupações financeiras, incertezas quanto ao fim desse período fez eclodir como um vulcão o sofrimento psicológico, que é visto por algumas pessoas, como bobagem. Pensamento retrógado e antigo, que causa a evolução e piora dos sintomas depressivos e ansiosos.

DEPRESSÃO
Outro ponto a ser esclarecido é que a depressão é tipicamente compreendida como uma pessoa que chora, se isola, não come ou come demais e que apresenta pensamentos negativos. Existe uma tipologia de depressão em que a pessoa trabalha, estuda, de certa forma apresenta uma funcionalidade, mas se sente sozinha, inferior, sem valor, não fala sobre seus sentimentos e apresenta uma desesperança em relação à sua vida.

Também existe um tipo de depressão que se refere ao humor irritado, a pessoa sempre fica reclamando, como se fosse a expressão “uma pessoa ranzinza”. As crianças também sofrem muito com sentimentos depressivos, que estão disfarçados de hiperatividade e falta de atenção.

Tem-se observado, também, as crescentes crises de ansiedade e pânico. As crises de ansiedade são caracterizadas pelos pensamentos que algo muito ruim vai acontecer, e a pessoa fica com medo e não sabe explicar o por quê. Isso acontece porque as pessoas não conseguem identificar sentimentos e situações que despertaram algum tipo de preocupação ou gatilho. A nossa mente usa mecanismos para nos livrar de ideias ruins, mas às vezes isso falha e ocorre a ansiedade.

A psicoterapia, com psicólogo habilitado pelo conselho de psicologia, auxilia a nomear sentimentos e situações que despertaram as crises sejam elas depressivas e/ou ansiosas. A medicação, em alguns casos, é essencial, pois o cérebro da pessoa que está ansiosa ou depressiva está com falta de “vitaminas” que chamamos tecnicamente de neurotransmissores.

Os medicamentos para ansiedade e depressão, não geram dependência. Esse é outra ideia que se tem sobre os medicamentos. Os medicamentos tratam os as células doentes, os neurônios, e repõem as “vitaminas”. O que as pessoas na realidade desejam é que a medicação, por si só, vá resolver todos os sentimentos de ansiedade, tristeza que precisam ser pensados e refletidos na psicoterapia.

VÍNCULOS FAMILIARES
Um aspecto para pensar é a qualidade dos vínculos na família, as crianças que apresentam ansiosas, depressivas e com dificuldades de aprendizagens mostram por meio desses sintomas os problemas na família. Discussão, brigas, cobranças em excessos, disciplina com agressividade, ou por outro lado a negligência podem desencadear problema psicológicas nas crianças e adolescentes.

Na pandemia, como as crianças ficaram em casa observou-se um aumento acentuado nos incidentes de violência doméstica. A nova geração mostra desafios gigantes para os pais. As crianças questionam, não aceitam de antemão uma regra ou punição sem compreender o sentido. Diversos autores destacam que a punição não funciona, só piora, ainda mais quando estamos falando de adolescentes.

Muitas vezes, observa-se frases “nem passou metade do meu sofrimento e está triste, não tem motivo” ou “dou tudo para ele e ainda assim não está feliz”. A geração de crianças e adolescente de hoje precisa de afeto, proteção, cuidado e ajuda! Também precisa de limites com afeto, sem agressividade. Cada um tem um jeito de lidar com os problemas, e subjugar o sofrimento das crianças só piora a situação e afasta ela do núcleo familiar.

Os vínculos da família protegem as crianças e adolescentes e tem-se observado cada vez mais as fragilidades na família. Uma ideia para isso é que as gerações de nossos pais, avós e tataravós precisavam de orientação psicológica, mas acreditavam ser bobagem e, por isso, não trataram aspectos que se repetem de geração em geração. Os efeitos da sociedade sem cuidados com a mente são vistos todos os dias. A pandemia fez isso explodir.

As escolas, empresas e instituições necessitam olhar para a saúde mental de seus alunos e colaboradores, uma vez que sem saúde mental não existe saúde. Sabe-se dos inúmeros desafios na volta às aulas, uma vez que as crianças e adolescentes ficaram isolados e com muitas tarefas em casa. Nas instituições, os sintomas ansiosos e depressivos se disfarçam de sintomas psicossomáticos que resultam em absenteísmo, por exemplo. Torna-se importante o olhar para o cuidado com a saúde mental.

Um ponto muito importante refere-se à necessidade de profissionais especializados para o cuidado da saúde mental: psicólogos e psiquiatras. Torna-se importante pensar que a pandemia trouxe diversas reflexões e uma delas refere-se a real necessidade do cuidado com a mente.

Patricia Dotta

Psicóloga CRP – 07/26999
Mestra em Psicologia Clínica
Especialista em Neuropsicologia e Neuropsicopedagogia.
Especializanda em Psicoterapia Psicanalítica


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